quarta-feira, 31 de outubro de 2012

ATPC - 31/10/2012

Análise do Problema na sua totalidade Antes de mais nada , para enfrentar o problema da disciplina, é necessário compreendê-lo, ou seja, entender o que está acontecendo hoje com a disciplina na sala de aula, na escola (e na sociedade). Com certeza, uma série de fatores influencia, mas devemos analisar como ocorre concretamente – como síntese de múltiplas determinações. No processo de análise é que irão emergindo os determinantes fundamentais do problema em estudo. 1 – ESTADO GERAL DA PERPLEXIDADE Está muito difícil conseguir a disciplina na escola. Vemos muitos professores perplexos, angustiados e pensando até mesmo em desistir da profissão, pois além dos baixos salários, do desprestígio social, ainda “têm que aguentar desaforos e desrespeito” dos alunos em sala de aula, que “não querem nada com nada”. Nas séries iniciais o problema parece menor, mas isto pode ser, de fato, só aparência, pois, por um lado, aí justamente pode estar sendo gestado, só não tendo se manifestado ainda em função da pouca idade; por outro lado, paulatinamente, temos ouvido cada vez mais queixas também destes professores, da 5ª série em diante, atualmente já existe reclamação de professores de 1ª e 2ª série, sem contar alguns casos alarmantes de reclamação de professores de Educação Infantil... Segundo muitos professores, nunca a situação em sala de aula esteve tão difícil como agora. Teria piorado a indisciplina nos últimos trinta/quarenta anos? A tendência é dizer que sim, em especial se considerarmos o nível de decibéis de ruído em sala de aula ... no entanto, poderíamos questionar: de que tipo de indisciplina estamos falando: apenas da ativa ou também da passiva? Neste segundo caso, as coisas já não ficam tão claras... O fato é que a indisciplina que amiúde preocupa o professor é a ativa e esta objetivamente parece ter aumentado. Diante desse fato, partiu-se para uma verdadeira “caça aos culpados”... a)Problema de família” Atualmente o grande foco da crítica e da atribuição de responsabilidades, pelos problemas de indisciplina na escola é o aluno e, em particular, sua família. De fato, percebemos muitas famílias desestruturadas, desorientadas, com hierarquia de valores invertida em relação à escola, transferindo responsabilidades suas para a escola, etc. tudo isto é verdade. Objetivamente, a família não está cumprindo sua tarefa de fazer a iniciação civilizatória: estabelecer limites, desenvolver hábitos básicos. Neste sentido, os educadores têm razão em levantar esta falha. No entanto, esta é a manifestação imediata; isto é o que aparece. O que não se faz é ir além da constatação... A pergunta que pouca gente se faz é: porque a família está do jeito que está? Ao não fazermos esta pergunta, corremos o risco de enveredar por uma crítica quase que moral, como se a família estivesse assim porque decidiu de “livre espontânea vontade”. Talvez, num exercício de descentração, os professores poderiam pensar um pouco sobre sua própria situação: acaso estão dando aula do jeito que estão – sem preparar muito, sem aprofundamento, sem clareza de objetivos, sem renovação metodológica, sem articulação interdisciplinar, sem relacionar os conteúdos com as necessidade dos educandos, etc. – porque decidiram “livremente”? A nosso ver, ao procurarmos entender o que está se passando com a família poderemos entender muito do que está acontecendo com a escola e com os próprios professores, já que tudo está relacionado, qual seja, os “ problemas de família” não se explicam por si mesmos. Além disto, esta compreensão nos ajudará a estabelecer um relacionamento com os alunos e suas famílias menos marcado pela acusação, possibilitando uma autêntica busca de assumir as responsabilidades respectivas, superando o famigerado “empurra-empurra”. b)A Escola mudou ( e o professor também) O professor anda confuso com tudo aquilo que vem acontecendo com ele, com a escola e com a sociedade. Há uma profunda mudança na relação Escola Sociedade e parece que não nos demos conta suficientemente disto. Nossa perspectiva é compreender para superar e não para cair no saudosismo (“Como as coisas eram melhores antigamente”, “No meu tempo...”) É importante fazermos uma análise histórica – ainda que muito breve – para compreender a realidade, o problema em toda sua dimensão. A pergunta que pode orientar esta análise é: o que mudou na escola nos últimos 30/40 anos? O que aconteceu com o professor? Há algumas décadas atrás, tínhamos: - valorização social da escola enquanto instrumento privilegiado de ascensão social; - Status, valorização do professor (como mediador da ascensão social); - Formação mais consistente do professor (em termos da realidade e dos objetivos de então); - Remuneração mais condizente para os professores; - Escola, via professor, como fonte privilegiada de informações; - Apoio incondicional da família à escola; - O perfil dos usuários que frequentavam a escola ( pelo menos os que conseguiam ficar mais, e com sucesso) tinha maior afinidade com o tipo de saber que ali era vinculado. Podemos apontar alguns indícios dessas transformações da escola (e do professor) nas últimas décadas no Brasil: - Expansão quantitativa x deterioração qualitativa; - Aumento efetivo do número de vagas no Ensino Superior na escola particular; - Fragmentação e esvaziamento na formação dos professores; - Diminuição drástica dos salários dos professores; - Parcialização do trabalho do professor no interior da escola: a entrada dos “especialistas”; - Degradação das condições de trabalho (falta de instalações adequadas, equipamentos, material didático, etc.) Paralelamente, houve crescimento do senso crítico dos educadores, com a contribuição, por exemplo, na década de 70, da sociologia crítica francesa. Tudo isto provocou um profundo mal -estar , uma verdadeira crise entre educadores, crise esta, como dissemos, até hoje não compreendida nem resolvida. A nosso ver, um outro fator fundamental para a crise da disciplina na escola e na sala de aula está em queda do mito da ascensão social através da escola. Até há alguns anos atrás, a escola não era também um espaço “agradável”, mas os alunos tinham uma motivação extrínseca: “ser alguém na vida”. Atualmente, com a queda deste mito, fica mais difícil para o professor conseguir um comportamento “adequado” do aluno, ainda que de passividade. c)A Sociedade Mudou À medida que avançamos na análise, constatamos que, na verdade, estas mudanças anteriormente apontadas estão intimamente relacionadas à mudança da sociedade como um todo. Tomando como recorte histórico os últimos quarenta anos, percebemos na sociedade brasileira mudanças profundas. De predominantemente rural, torna-se urbana (com desenraizamento econômico, cultural, afetivo, religioso), havendo um acelerado processo de industrialização e de expansão das telecomunicações. Num período mais recente, podemos observar: - Crise ética (“levar vantagem em tudo”, corrupção, falta de projeto nacional); - Concentração de renda ( o Brasil está entre as dez maiores economias do mundo, mas é o segundo em concentração de renda); - Economia recessiva (investimento na especulação financeira ao invés de na produção); - desemprego, subemprego (reflexo do modelo econômico). Ao mesmo tempo, temos, - Economia baseada na produção de bens de não primeira necessidade; - Meios de comunicação nas mãos de poucos e poderosos grupos; - Gasto elevadíssimo e alta qualidade da propaganda nos meios de comunicação. Este processo fortíssimo de indução ao consumismo vai levando a uma infantilização da sociedade, onde há busca de satisfação imediata do prazer, baixando a capacidade de tolerância à frustração, aumentando a agressividade, a violência. A concentração de renda no país e a ânsia de consumo, são dois fatores que influenciam a dinâmica familiar, tendo como consequências: - O homem trabalha mais; - A mulher vai para o mercado de trabalho; - A preocupação com o desemprego; - Menos tempo (quantitativo e sobretudo, qualitativo) para a família. Os responsáveis pela família de classe pobre acabam tendo que trabalhar mais para garantir a sobrevivência. Os de família de classe média e alta, de um modo geral, trabalham mais para consumir mais e sustentar um padrão de vida sempre mais elevado que os demais. (In)Disciplina – Celso Vasconcelos Reflita e responda as perguntas a seguir. 1) Segundo o autor, quais são os fatores que influenciam na indisciplina em sala de aula hoje? 2) De fato percebemos que as famílias estão desestruturadas e com valores invertidos transferindo suas responsabilidades para a escola e não estão cumprindo o seu papel de estabelecerlimites e desenvolver hábitos básicos. De acordo com Celso Vasconcelos, qual seria a importância de entendermos as mudanças pelas quais vem passando a família? 3) Quais foram as mudanças que aconteceram com a escola e com o professor nos últimos anos? 4) Segundo o texto, qual era a motivação que os alunos tinham há alguns anos atrás para freqüentar a escola?